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  • Foto do escritorAndrea Quirino

Narciso acha feio o que não é espelho?


Narcisismo saudável ou transtorno de personalidade narcisista?


Faz parte de um desenvolvimento saudável o estágio de narcisismo. É justamente nessa via que vai se dar a constituição do “eu” por imagens e a relação com o Outro. Trata-se da relação do sujeito com seu próprio corpo nos termos de sua identificação com uma imagem: eu sou essa imagem. Assim acontece o advento da alteridade.

Segundo Freud, o ser humano tem, inicialmente, dois objetos de desejo, que são ele mesmo e sua mãe. Freud também compreende que o amor dos pais pelos filhos é um narcisismo renascido. Mas, com o tempo, a criança vai percebendo que não é o único objeto de interesse dos pais, o que pode ser sentido como ferida narcísica e vai fazê-la investir em reconquistar esse amor.

Temos, então, o ego ideal, que é um substituto dessa onipotência infantil e, ao mesmo tempo, é produto da imagem do “ideal" de seu eu, do que seria valorizado por esses pais ou cuidadores, numa busca de perfeição.

Existe uma recusa em abrir mão desse narcisismo perdido, sendo que esse ideal exige do ego a perfeição, provocando repressão do que seria indesejado nessa configuração. Para Freud, o objeto a ser amado representa uma escolha narcísica: amar a si mesmo através do outro, numa imagem sexualmente investida.

Mas nesse espectro de narcisismo, temos os traços leves de um lado e o transtorno de personalidade narcisista, com esses traços num nível maior, de outro lado. Nesse caso, temos um indivíduo que tem falta de empatia, muita dificuldade em compreender os sentimentos do outro, e que busca constantemente ser o centro das atenções.

Esse tipo de pessoa com esse transtorno de personalidade gosta de ser enaltecido e não vai medir esforços para alcançar seu objetivo. Muitas vezes tem uma alta habilidade na sedução e no carisma, pois conquistar a admiração é uma necessidade. Ele precisa de muita atenção e admiração.

A tendência de suas relações é que, com o tempo, passado o estágio inicial da sedução e do carisma, não se sustentem, já que não haverá a conexão com os sentimentos do outro. Isso, no caso de parceiros amorosos ou na amizades, pode levar a um relacionamento tóxico e/ou abusivo.

A pessoa que se relaciona com alguém que tem o transtorno de personalidade narcísica comumente se sente emocionalmente exausta, pois demanda muita energia estar com alguém que quer receber, ser servido, ser admirado, ter sempre a razão e que controla e impõe regras (mesmo que as regras não sejam explícitas) o tempo todo.

Uma relação saudável precisa de equilíbrio de troca, ambos dão de si e ambos recebem do companheiro. No caso de uma relação afetiva com um narcisista, isso não acontece.

Também quando temos mãe ou pai narcisista, muitos aspectos necessários para a criança, como receber carinho, cuidado e proteção, não acontecem. Narcisistas são voltados para si mesmos, não é possível a essa pessoa realmente enxergar o outro tal qual é. A relação com o outro passa a ser uma projeção que o narcisista faz de si mesmo.

Ele se sente com direitos especiais e acha que sempre sabe mais que os outros. Quando é contrariado pode se tornar raivoso, tem muita dificuldade com a frustração. Como não vê o outro, - o outro é apenas uma extensão de si mesmo-, quer transformar o parceiro no que deseja.

Outra característica que podemos perceber nos narcisistas, é que costumam desqualificar as pessoas em sua volta para se sentirem grandiosos. Também usam de vitimismo, chantagem e coação em seus relacionamentos, para se sentirem no controle, com razão e com segurança emocional.

Isso porque o narcisista tem um profundo desequilíbrio, um medo profundo de rejeição. Tem dependência emocional da aprovação e admiração alheios. É obcecado pela sua imagem (sucesso, beleza, poder), pois quer estar sempre em destaque.

As relações que o narcisista faz com outras pessoas sempre tem ganhos em troca. Costumam distorcer fatos e histórias para atrair a admiração e muito dificilmente compreendem que precisam de terapia.

É muito importante compreendermos o transtorno de personalidade narcisista para identificarmos em nós mesmos, ou nas pessoas próximas a nós. Se temos esse transtorno, precisamos admitir, aceitar e buscar ajuda terapêutica o quanto antes.

Se temos alguém próximo a nós com esse transtorno, ao compreendermos do que se trata, estaremos mais preparados para lidar. Do contrário, podemos nos sentir presos, esgotados mentalmente e emocionalmente, frustrados e impotentes, porque não importa o quanto iremos tentar fazer o narcisista nos entender ou ficar satisfeito com a relação, simplesmente não será possível, isso não acontecerá.

O narcisista não sabe receber crítica, e seus sentimentos de vulnerabilidade podem estar inconscientes. Suas relações costumam fracassar e, com o passar dos anos, podem ter muitos problemas na área profissional, familiar e no casamento. Podem apresentar propensão para o abuso de álcool e drogas. Outras complicações potenciais podem ser pensamentos suicidas e automutilação.

Podem ter sido uma criança que foi negligenciada, muito criticada pelos pais ou, então, que sentiu grande desamparo emocional. Também pode ter sido exageradamente admirada pelos pais, perdendo o contato com a realidade de suas próprias limitações e imperfeições humanas. Nesse caso, se identificaram com a imagem ideal que os pais projetaram nele.

Mas se estes sentimentos ficam inconscientes não podem ser elaborados. Nesses casos, terapia é fundamental, e pode ajudar a pessoa a manter suas relações saudáveis e ter mais qualidade de vida.


Texto de Andrea Quirino

Título inspirado na música de Caetano Veloso

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